quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Crônicas do Irani (PARTE V).

         Personagens do Combate de 1912

Alguns personagens do Combate do Irani precisam ser lembrados.
É preciso que se repare a injustiça feita contra essa gente, acusada de tudo de ruim que se possa imaginar.
São pessoas que nada mais fizeram do que defender as terras de onde tiravam o sustento de suas famílias. Não eram marginais ou bandoleiros, mas passaram à história como se tivessem sido.
Thomaz Fabrício das Neves com a família na década de 1920. Acervo: Vicente Telles. Reprodução: Celso Martins. Thomaz, irmão de José Fabrício das Neves, foi processado, preso e inocentado após o combate. Morreu em Coronel Domingos Soares-PR.
Estamos falando de pessoas cujos descendentes ainda residem no Irani e região, ou foram para o Sudoeste do Paraná e outras áreas.
Muitos tiveram que adotar outros sobrenomes, como os Antunes das Neves, descendentes diretos de José Fabrício das Neves que residem em Pinhão-PR. O mesmo fizeram alguns filhos de Thomaz Fabrício das Neves, irmão de José, na região de Palmas.
Em relação a José Fabrício das Neves vimos sua parceria com José Maria e seu papel destacado no Combate. Vamos ver a seguir sua presença no restante do Movimento do Contestado.
Sabemos que nasceu na região de Passo Fundo-RS, onde aos 13 anos participava de combates da Revolução Federalista (1893-1895), ao lado dos maragatos. Foi emboscado e morto em 1925. A sepultura pode ser visitada nas margens do rio Irani, no município de Vargem Bonita.
Fornecemos a seguir uma espécie de “lista” de alguns indiciados no Inquérito que gerou o Processo do Irani, aberto em Palmas no dia seguinte ao do combate. São vários objetivos ao se enfatizar a “lista”. Em primeiro lugar destacar os combatentes de uma luta pela terra, amparados na fé católica e na religiosidade de São João Maria.
Em segundo estimular os descendentes destas pessoas a contribuir com a memória do combate. Muitos não o fazem por vergonha desse passado, mas a maioria por não saber dar o devido valor a uma fotografia, uma carta, uma oração, uma lembrança dos mais antigos ou relatos ouvidos na infância.

A “lista”
José Alves Perão, conhecido por José Felisberto, foi participante ativo e uma espécie de braço direito de José Fabrício, antes, durante e depois do combate. Seu irmão Elizeu também participou. Havia outro irmão, Desidério, e a mãe deles, dona Joana. Os Perão têm origem na Argentina com o sobrenome Perón, depois aportuguesado. Existe a versão Perone ligada ao mesmo Perón/Perão.
Elizeu Perão (sentado, ao centro), combatente de 1912 no Irani. Acervo: Vicente Telles. Reprodução: Celso Martins.
A família Belchior também esteve presente, como Cândido, Antônio, João e Manoel.
Bento Manoel dos Santos era o chefe de numerosa família. Conhecido por Bento Quitério. É referido por vários historiadores, pois foi ao lado da sua casa que João Gualberto montou a metralhadora. E foi onde também morreu. Um filho de Bento, Felipe, morreu em combate e foi sepultado no antigo cemitério do Irani. Outro filho, Alfredo, teve participação ativa. Saturnino Manoel dos Santos, irmão de Bento, também estava no combate.
O coronel da Guarda Nacional Miguel Fragoso, paranaense estabelecido no Engenho Velho (Concórdia), e antigo maragato, se deslocou ao Irani com dezenas de homens armados em socorro de José Maria. Mais tarde um filho de Miguel, Chico Fragoso, morou e se casou no Irani. Seus descendentes estão em Coronel Domingos Soares e Palmas.
José Alves Perão, conhecido por José Felisberto. Combateu ao lado de José Fabrício e José Maria no Banhado Grande em 1912.
Outros Fabrício das Neves são: Miguel (tio de José e de Thomaz). Thomaz, irmão de José. Clementino (secretário de José Maria), Antônio (possivelmente o pai de José e Thomaz). Gabriel Fabrício das Neves não foi indiciado, mas seu nome é citado como apoiador por Maurício Vinhas de Queiroz. O mesmo acontece com o pai de Antônio Martins Fabrício das Neves, a quem nos referimos em Crônicas do Irani 2.
Os Lemos também estiverem presentes no combate, como Francisco e João Lemos.
Sobre várias pessoas não encontramos maiores referências ou descendentes, como: Firmino Sapateiro, Luiz (indicado como filho de João Luiz), João Venerando, Paulo Ramos, Estanislau Borges, Raphael de Brum, Sÿnfronio Honorato do Canto, Sebastião Lageano, Sebastião Vicente, Sebastião Baiano, Venâncio Lageano, Veríssimo de Faria, Benedicto Teixeira Guimarães, Emiliano Glória, João e Joaquim Bello, Joaquim Antônio Santiago, Mathias Ermelindo, Manoel Barreto, Francisco Maria, João Vermelho, Joaquim Germano, Joaquim Gomes e José Clementino.  Muitos desses homens podem não ser do Irani e seu sertão, Queimados (atual Concórdia).

A história
José Fabrício das Neves (segurando os arreios do cavalo) e um Miguel. Acervo: Reinaldo Antunes (Pinhão-PR). Reprodução: Celso Martins.
É preciso esclarecer que nem tudo na História é permanente e definitivo. Existem problemas a serem resolvidos. Que a Guerra do Contestado aconteceu ninguém duvida, está fartamente provado e documentado, guardado na memória, mas quando passamos para as suas causas surgem os problemas.
Como toda ação humana, escrever é um ato cultural, uma construção, um parecer a partir das fontes, informações reunidas e da visão de mundo/ideologia do autor que condiciona o enfoque. 
No caso do Contestado vamos citar uma seqüência de expressões e adjetivos dos que escreveram sobre o tema, esclarecer do que estamos falando.

Setembrino de Carvalho, 1915
Fanáticos, inimigo, bandoleiros, carolas, criminoso aldeamento, banditismo, ousadia feroz, movimento revolucionário, matutos, jagunços, desordeiros, sedição, populações ignorantes, fanatismo funesto, antros criminosos, falsa religião, segregados dos centros de civilização, hidra da anarquia, perturbadores da ordem republicana, patrícios transviados da lei.

Demerval Peixoto, 1916
Afamado antro de bandidos, facínoras, degenerados, índio feroz, entes desgraçados, covil afamado, entes desgarrados, aluvião de infelizes, irmãos enlouquecidos das selvas, matutada, brasileiros transviados, movimento de bandoleiros, astuta matutada. Sertanejo semi-bárbaro, esqueléticos caipiras, combatentes pecadores, meliantes, tabaréus, malfeitores, traiçoeiros e sanguinários.

José Herculano Teixeira d’Assumpção, 1917
José Maria: perfeito farsante, pseudo-irmão de João Maria, pseudo-asceta, inteligente, desertor, satisfazia seus cúpidos desejos em algumas ingênuas donzelas sertanejas.

Oswaldo Rodrigues Cabral, 1979
Grupo de sertanejos, fé exaltada e desviada da ortodoxia católica, monge ignorado e ignorante, sertanejos rudes, monge estranho, fanatismo, doutrinas sediciosas, rebelião, crime, loucura, sertanejo rebelado, fanatismo religioso, doutrinas subversivas, bando de rústicos, bando de fanáticos, jagunços. Sobre José Maria: impostor, taumaturgo.  

Maurício Vinhas de Queiroz, 1981
Homem, curandeiro de ervas, sertanejos, messias, ajuntamento de povo, discípulos, místico retorno, acampamento religioso, adeptos de José Maria, ninho de guerrilheiros, movimento messiânico do Contestado, massas camponesas, direito de terras.

Ivone Gallo, 1999
Movimento popular, eremita, andarilho, profeta, curandeiro, milenarismo, revoltosos, rebeldes, excluídos, guerra sertaneja, caboclos, lideranças do Contestado.

Delmir Valentini, 2003
Sertanejos, José Maria e seus seguidores, movimento, fraternidade, líderes, exaltação mística, sonho da convivência fraterna, pessoas nos redutos, comandante José Maria.

Paulo Pinheiro Machado, 2004
Sertanejos seguidores do monge, lideranças sertanejas, movimento social do Contestado, características místicas, exaltação milenar, messianismo, líderes do reduto, movimento rebelde. (Por Celso Martins, outubro de 2011)
 José Fabrício das Neves e seus homens, possivelmente em Catanduva em 1919. Acervo Reinaldo Antunes (Pinhão-PR).



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